Parque Industrial: a crítica e genialidade de Pagu em muitas facetas
- Colaborador externo
- 4 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
O livro Parque Industrial: romance proletário foi publicado em 1933, por Patrícia Galvão, sob o pseudônimo de Mara Lobo, e aborda a vida da classe operária nas ruas do Brás, um bairro de São Paulo em processo de industrialização.
Com o foco maior nas personagens femininas, acompanhamos a narrativa das operárias Corina, Otávia e Rosinha, e da burguesa Eleonora. A obra é apresentada em 16 capítulos curtos, cenas-fragmento, que configuram uma leitura rápida e de linguagem popular pelas vidas exploradas ao longo da trama.

Desde o início, Pagu – como é conhecida a autora – já nos mostra seu caráter militante dentro do romance ao criticar com firmeza a classe burguesa. São boêmios passeando pelo centro industrial.
“Pelas cem ruas do Brás, a longa fila dos filhos naturais da sociedade. Filhos naturais porque se distinguem dos outros que têm tido heranças fartas e comodidade de tudo na vida. A burguesia tem sempre filhos legítimos. Mesmo que as esposas virtuosas sejam adúlteras comuns.” (Parque Industrial, pág. 14)
Além disso, a descrição urbana e social que temos de uma São Paulo industrializada forma o retrato massivo do capitalismo em nossa sociedade e suas consequências. Se pararmos para assimilar, ainda estamos nessa mesma relação abusiva com o sistema. Os mesmos que “se interessam” pelos trabalhadores apenas por chacota e outras intenções longe da luta coletiva, são os de agora na apropriação da causa e cultura popular.
“Vocês pensam que os ricos namoram a gente a sério? Só pra debochar.” (Parque Industrial, pág. 15)
Algo mais que me prendeu no livro foram as constantes reviravoltas, de maneira natural, que constroem a narrativa. Tecelagens, sindicatos, uma burguesa e uma proletária como amantes, a folia e o crime no Brás, as regalias da burguesia e um aliado burguês ao movimento, a prostituição, a maternidade vinda das esquinas, a violência contra a causa dos trabalhadores – mas que não é capaz de acabar com a esperança da Revolução.¹ É um mundo plural, onde essa pluralidade vai se tornar uma única coisa: a vontade gritante de se libertar. Podemos encontrar essa e outras facetas na obra de Pagu.
“Neste momento todos lutam. Não há indivíduo.
São todos proletários! [...] Tiros, chanfalhos, gases venenosos, patas de cavalo. A multidão torna-se consciente, no atropelo e no sangue.” (Parque Industrial, pág. 73 e 75)
Entretanto, uma observação que deixo é que, em alguns momentos, a crítica parece exagerada. Você pode se questionar: como os pobres trabalhadores conseguiam colocar tanta energia na luta contínua? Pois bem, alguns exemplos narrados podem parecer exclusivamente panfletários. Porém, trata-se de um livro de quase um século atrás, escrito por uma jovem engajada politicamente pelos ideais marxistas na tentativa de provar seu compromisso com o Partido Comunista e que, sobretudo, cresceu no bairro do Brás tendo experiência e participação nas manifestações. Levando isso em conta, não é de se estranhar essa característica citada.
“Que importa morrer de bala em vez de morrer de fome!” (Parque Industrial, pág. 24)

Afirmo, ainda, que a história me envolveu em cada novo drama que se desenrolava, principalmente por ser de fácil compreensão e, ainda assim, perfurar tantas camadas da sociedade capitalista. Para mim, o ato célebre de Pagu foi não optar pelo final utópico que todos esperamos, mas sim escolher mostrar a verdade nua e crua pelos setores da sociedade paulista; a dura realidade que a classe menos favorecida enfrenta – dentro e fora da ficção.
Cada personagem se faz protagonista em algum ponto do romance e todos têm relevância, ainda que para te fazer sentir desde empatia, até repúdio.
Parque Industrial é uma obra subestimada, que mesmo com estudos sobre seu conteúdo, ainda ficou sob a sombra das influências do marido da autora na época, Oswald de Andrade.² Esse tipo de interpretação reduz a dimensão literária da obra e questiona a autenticidade de Patrícia como escritora. É importante que saibamos dar o mérito necessário quando uma mulher se posiciona de tal forma crítica e ironiza a classe exploradora que se sustenta, dia após dia, pela força de trabalho do povo.
Que se conheça a genialidade de Pagu e sua denúncia brutal para este mundo!

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